Bento Azevedo

A 9.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná manteve, por unanimidade de votos, a sentença do juiz da 4.ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, Alberto Luís Marques dos Santos, que determinou que o proprietário de um imóvel situado em um edifício residencial (Condomínio Residencial Nápoles), em Maringá (PR), abstenha-se de alugar o apartamento para formação de república de estudantes (forma de moradia pela qual vários estudantes coabitam um mesmo local e dividem as despesas mensais). A decisão respalda-se no Regimento Interno do Condomínio, que proíbe a locação do imóvel para tal finalidade, bem como no art.10 da Lei n.º 4.591/64, que dispõe sobre o condomínio em edificações.

O recurso de apelação

Inconformado com a decisão de 1.º grau, o proprietário do imóvel (J.C.M.) interpôs recurso de apelação alegando que a limitação ao direito de propriedade imposta pelo Regimento Interno do Condomínio não é absoluto, pois deve sempre prevalecer o contido na Constituição Federal, que assegura a todos o direito de propriedade. Asseverou que a convenção do condomínio não pode proibir a coabitação de dois ou mais indivíduos, ainda que solteiros e sem vínculo de parentesco, pois não se confunde com república de estudantes. Afirmou ainda que a locação teve a finalidade residencial e que o condomínio teve ciência de quem seriam os moradores desde o início, argumentando que inexiste legislação que vede a instalação de repúblicas em prédio; portanto, a vedação é preconceituosa e ilegal. Por fim, argumentou que a locação para estudantes não trouxe qualquer prejuízo ao condomínio, razão pela qual requer o provimento do recurso para que se reforme a sentença.

O voto da relatora

A relatora do recurso de apelação, juíza substituta em 2º grau Sandra Bauermann, consignou inicialmente: “Infere-se dos autos que o Condomínio Residencial Nápoles ajuizou ação de procedimento ordinário de cunho declaratório de descumprimento de dispositivo legal e preceito cominatório em face de […], visando o cumprimento da cláusula do Regimento Interno do condomínio que veda a locação das unidades com a finalidade de instalação de república para estudantes”.

“No caso, o Regimento Interno do Condomínio Residencial Nápoles dispõe que: ‘Art. 2º. Os apartamentos, no todo ou em parte, destinam-se exclusivamente a fins residenciais, sendo expressamente proibido o uso, locação ou sessão para atividades profissionais, comerciais ou industriais de qualquer natureza, para depósito de qualquer objeto, para ‘república de estudantes’.”

“O réu, ora apelante, não nega que o apartamento foi locado para estudantes, sem vínculo familiar, apenas insurge-se quanto à referida disposição regimental que, no seu entender, fere o direito constitucional de propriedade que estaria acima de eventuais convenções condominiais.”

“Inicialmente, vale dizer que não há sombra de dúvidas de que o regimento interno do condomínio é norma de ordem infralegal e, jamais poderia sobrepor-se a uma norma constitucional.”

“Ocorre que, sem embargo desta premissa, o art. 10 da Lei n.º 4.591/64, que dispõe sobre o condomínio em edificações, estabelece ser defeso a qualquer condômino ‘destinar a unidade a utilização diversa de finalidade do prédio, ou usá-la de forma nociva ou perigosa ao sossego, à salubridade e à segurança demais condôminos’.”

“No caso em tela, o argumento utilizado pelo condomínio para prevalecer a validade da convenção é a de que os estudantes perturbavam o sossego dos demais moradores, acostando aos autos, diversas reclamações registradas em livro próprio do condomínio.”

“Assim sendo, tem-se que a convenção do condomínio deve prevalecer até que haja a inequívoca demonstração de que suas regras extrapolam o limite desejável, infringindo direito dos seus próprios condôminos. Não é o que ocorre no caso em tela.”

“Observe-se que o regimento interno do condomínio foi aprovado por unanimidade de votos e o próprio réu, ora apelante esteve na assembléia, no momento em que houve a aprovação e concordou com seus termos.” “Além disso, para que tal regra fosse afastada seria imprescindível a demonstração de que se trata de norma abusiva e ilegal, mas aparentemente, visa justamente resguardar o sossego de condôminos.”

“Nesse ponto, vale colacionar as palavras do douto magistrado: ‘Ora, o que o réu pretende é convencer o juízo a desconhecer o que todos sabem e decidir ignorando os fatos notórios da experiência cotidiana. Todos sabem o que é uma república de estudantes. (…) É exatamente, o que existe no apartamento do réu no condomínio do autor: uma habitação de quatro estudantes solteiros que não compõem uma família, e não vivem com um adulto responsável. Uma república. Exatamente o que o regimento interno proíbe. O mais são jogos de palavras e sofismas’.”

“Constata-se, desta forma, que inexiste abusividade ou qualquer lesão ao direito de propriedade; ao contrário, estamos apenas diante de uma regra estipulada por toda a coletividade que impõe pequena restrição que não infringe o direito constitucional de propriedade.”

“Assim sendo, entende-se que a r. sentença deva ser integralmente mantida.”

Participaram da sessão de julgamento os desembargadores Rosana Amara Girardi Fachin e D’Artagnan Serpa Sá, que acompanharam o voto da relatora.

Fonte: Tribunal de Justiça do Paraná
Data: 23/08/2011